MULTICULTURALISMO E FILOSOFIA (Murilo Moraes Júnior)
O multiculturalismo surge como um fenômeno social com a ideia de ‘pluralizar’ a cultura. Etimologicamente, Multi significa pluralidade ou muitos; enquanto que cultural, ou melhor, cultura, advém de criação humana.
O multiculturalismo implica falar sobre o jogo das diferenças, cujas regras são definidas nas lutas sociais por atores que, por uma razão ou outra, experimentam o gosto amargo da discriminação e do preconceito no interior das sociedades em que vivem, tendo incidido sobre a necessidade de ressignificação de conceitos como direitos humanos, democracia e cidadania.
A discussão sobre do multiculturalismo questiona o conhecimento transmitido nas diversas instâncias produtoras e transmissoras de cultura, identificando etnocentrismos, visões estereotipadas de determinados grupos e buscando aberturas para a incorporação de uma pluralidade de vozes, de formas diversas de se construir e interpretar a realidade. As categorias teóricas do multiculturalismo permitem uma leitura de mundo a partir de procedimentos lógicos inerentes às culturas dominadas, produzindo, assim, um novo conhecimento e, por consequência, uma nova subjetividade descentrada e emancipada de valores supostamente superiores.
O multiculturalismo implica falar sobre o jogo das diferenças, cujas regras são definidas nas lutas sociais por atores que, por uma razão ou outra, experimentam o gosto amargo da discriminação e do preconceito no interior das sociedades em que vivem, tendo incidido sobre a necessidade de ressignificação de conceitos como direitos humanos, democracia e cidadania.
A discussão sobre do multiculturalismo questiona o conhecimento transmitido nas diversas instâncias produtoras e transmissoras de cultura, identificando etnocentrismos, visões estereotipadas de determinados grupos e buscando aberturas para a incorporação de uma pluralidade de vozes, de formas diversas de se construir e interpretar a realidade. As categorias teóricas do multiculturalismo permitem uma leitura de mundo a partir de procedimentos lógicos inerentes às culturas dominadas, produzindo, assim, um novo conhecimento e, por consequência, uma nova subjetividade descentrada e emancipada de valores supostamente superiores.
JÜRGEN HABERMAS (Fonte: Guia do Estudante abril)
Nesse contexto, o filósofo Habermas, propõe uma teoria da racionalidade e da sociedade que centra as potencialidades utópicas de emancipação nas micro-revoluções do cotidiano e nas aprendizagens sociais de sujeitos, capazes de linguagem e ação, participantes de um mesmo mundo, o qual podem problematizar, tanto para buscar mais conhecimento, para combinar normas de convivência ou para expressar sua subjetividade de forma descentrada. Portanto, é por meio de intervenções concretas no mundo entre sujeitos utilizando corpo e palavra para tais intervenções que se estruturam novas possibilidades de racionalidade e de participação em esferas cada vez mais amplas da cultura, bem como de
participação na esfera pública.
A partir desta constatação, Habermas desenvolveu sua Teoria da ação comunicativa, uma ética do discurso e uma filosofia política, no sentido de uma militância voltada para a busca de consensos que se realizam mediante aprendizagens sociais. É preciso aproximar o local do global pela compreensão e argumentação. Aprender a colocar-se no lugar do outro e cultivar a reciprocidade e a cooperação.
MULTICULTURALISMO NA REGIÃO DO CONTESTADO (Arthur Luiz Peixer e Karoline fin)
Multiculturalismo enquanto teoria não é apenas uma categorização pura e simples que diferencia pessoas e suas origens. É um termo que apresenta historicamente a formação de uma sociedade a partir da miscigenação étnica e das influências de variadas culturas, como é o caso do Brasil. Assim, ele vai para além da formação étnica, buscando entender mais profundamente quais características culturais formaram um determinado povo. Portanto, o multiculturalismo visa entender as bases de formação de uma determinada sociedade, compreendendo seus diferentes grupos sociais e levando em consideração os aspectos de marginalização impostos sobre parte dela, que se desenvolvem a partir de um projeto de centralização do poder.
Desta maneira, o conceito de multiculturalismo amplia os debates sobre os projetos emancipatórios e leva em consideração o reconhecimento da luta contra as diferenças e as desigualdades, buscando construir diálogos relacionados à identidade cultural de diferentes grupos e a sua representatividade na formação de uma sociedade, propondo um novo ideal de cidadania.
Obra do pintor catarinense Willy Alfredo Zumblick (1953) retratando a heroína Maria Rosa (Fonte: appai.org)
Ao elucidar esses elementos, percebemos que no território do Contestado, onde ocorreu uma guerra sangrenta entre 1912 e 1916, há uma disparidade social que é reflexo da ocorrência deste conflito e do modo de vida existente nessa região no final do século XIX e início do século XX. A entrada das empresas estrangeiras, Brazil Railway Co. (responsável pela construção da ferrovia) e da Southern Brazil Lumber & Colonization Co. (madeireira e colonizadora), que tinham como intuito trazer o “progresso” e o “desenvolvimento” aos olhos da economia e do processo de industrialização, somadas ao desmando dos coronéis, característico do período da Primeira República Brasileira (1889-1930), implicou na imposição de um modo de vida completamente diferente do que se tinha nas regiões Meio Oeste catarinense e Sudoeste paranaense.
Esta terra que era habitada já a gerações por indígenas, principalmente das etnias Guarani, Xokleng e Kaigang, pequenos posseiros de origem cabocla, descendentes de combatentes na revolução Farroupilha e Federalista, além dos primeiros imigrantes italianos e alemães, que viviam em sua grande maioria de pequenos roçados, criações e da venda sazonal da erva-mate como meio de subsistência, além de agregados e trabalhadores das grandes fazendas dos coronéis. Toda essa realidade sócio-cultural foi alterada com a chegada das grandes empresas e da “modernização” aparente que elas carregavam consigo.
Percebe-se, analisando a situação da região, que o grande latifúndio e o processo de industrialização levaram ao esmagamento dos modos de vida locais, o que vai, em certa medida, ocasionar o conflito, visto que gera a junção dessas minorias populacionais envoltas de uma religiosidade cabocla messiânica baseada na sobrevivência mútua. Esse aspecto acaba também por criar novos contornos, novos laços culturais caboclos. Entretanto, há que se destacar que ao projeto de industrialização somava-se um projeto colonizador, que atraiu para cá imigrantes, em sua maioria europeus, o que tornou a região ainda mais rica, cultural e etnicamente falando. Cabe destacar também que, para além das imigrações europeias, a região recebeu também nas décadas seguintes imigrantes asiáticos, como é o caso do município de Frei Rogério, berço da comunidade japonesa regional.
Porém, quando analisamos a construção do aspecto multicultural da região do Contestado, o que percebemos é uma valorização maior da imigração européia, vinda de um processo colonizador que expulsou e escanteou as populações locais, oriundas da miscigenação indígena, africana e europeia, os caboclos. Estes, que têm suas principais representações nas camadas mais pobres da sociedade contestada, apesar do silenciamento mantiveram e, em muitos casos resgataram, sua cultura, identidade e religiosidade, sendo o culto aos monges um dos exemplos mais diretos dessa realidade.
Caboclos "vaqueanos" contratados pela Lumber para caçar os revoltosos. (fonte: anovademocracia.com.br)
Essa onda migratória europeia estabelece na região uma hegemonia, visto que as camadas mais ricas da população acabam por controlar o discurso cultural. Estas famílias encaixam o território Contestado no seu status quo, que tem como base os costumes europeus, além de contar com os moldes do capitalismo desenvolvimentista encabeçado pelas indústrias do grupo Farquhar. Estes elementos são em si contrários à realidade em que a região vivia antes do conflito, principalmente no que diz respeito ao uso da terra, esta, que foi arbitrariamente tomada das populações caboclas locais, vai se tornar não mais uma fonte de vida, mas uma fonte de renda, desmatada e desnutrida pelo reflorestamento sistemático da indústria madeireira. Da mesma maneira a cultura regional vai sendo desmantelada, apropriam-se costumes e reformulam-se tradições para que elas sejam cada vez mais brancas e europeizadas, enquanto as populações originárias, que desde antes do conflito já estavam marginalizadas pelo Estado brasileiro, permaneçam escondidas. Um grande exemplo deste processo foi, por exemplo, a mudança do nome da região turística a qual pertencemos, antes Vale do Contestado, hoje, Vale dos Imigrantes.
O multiculturalismo enquanto teoria serve, nesse contexto, para identificar aspectos relativos a compreensão de grupos marginalizados, sendo a sociedade contestada um reflexo do domínio cultural da elite econômica que perdura e apagou das representações culturais da região a figura dos trabalhadores pobres dos campos contestados. Assim como a imigração europeia possui ampla representatividade cultural na região do Contestado, é necessário aceitar a pluralidade existente na mesma, principalmente quanto à identificação e a materialidade da cultura cabocla, retirando da mesma os estigmas que ainda carrega desde à época do guerra, tornando o povo caboclo parte da miscelânea de grupos que formam o sul do Brasil e colaborando na reconstrução da imagem nacional sobre a região do Contestado.
REFERÊNCIAS
AURAS, Marli. Guerra do Contestado: a organização da Irmandade Cabocla. Florianópolis: Ed. da UFSC, 1984.
DIESEL, Aline; SANTOS BALDEZ, Alda Leila; NEUMANN MARTINS, Silvana. Os princípios das metodologias ativas de ensino: uma abordagem teórica. Revista Thema, [S.l.], v. 14, n. 1, p. 268-288, fev. 2017. ISSN 2177-2894. Disponível em: <http://revistathema.ifsul.edu.br/index.php/thema/article/view/404>. Acesso em: 24 abr. 2020. doi:http://dx.doi.org/10.15536/thema.14.2017.268-288.404.
HABERMAS, Jurgen. Consciência moral e agir comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro,1989.
KRETZMANN, Carolina Giordani. Multiculturalismo e Identidade Cultural: Comunidades Tradicionais e a Proteção do Patrimônio Comum da humanidade. Caxias do Sul, 2007.
OLIVEIRA, Cynthia Bisinoto Evangelista de; MOREIRA, Paula Cristina Bastos Penna (Orgs). Docência na socioeducação. Brasília: Universidade de Brasília, Campus Planaltina, 2014. Disponível em: https://cdnbi.tvescola.org.br/contents/document/publications/1449253233482.pdf. Acesso 24 abr. 2020.
SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 15ª ed, RJ: Forense, 1998, p. 234.
DIESEL, Aline; SANTOS BALDEZ, Alda Leila; NEUMANN MARTINS, Silvana. Os princípios das metodologias ativas de ensino: uma abordagem teórica. Revista Thema, [S.l.], v. 14, n. 1, p. 268-288, fev. 2017. ISSN 2177-2894. Disponível em: <http://revistathema.ifsul.edu.br/index.php/thema/article/view/404>. Acesso em: 24 abr. 2020. doi:http://dx.doi.org/10.15536/thema.14.2017.268-288.404.
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SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 15ª ed, RJ: Forense, 1998, p. 234.
COMO CITAR ESSE ARTIGO:
FIN, Karoline. MORAES JÚNIOR, Murilo. PEIXER, Arthur Luiz. MULTICULTURALISMO NO CONTESTADO. In: Blog EnsinArthur. Disponível em:https://ensinarthur.blogspot.com/2020/07/multiculturalismo-no-contestado.html publicado em: 31 de julho de 2020. Acesso: [informar a data].
PARA ENTENDER MAIS:
- MULTICULTURALISMO
- GUERRA DO CONTESTADO:
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